Brasil e a “Olimpíada” da sustentabilidade

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- outubro 10, 2013

Nesses dias de Olimpíada as atenções estão voltadas para a China. Repetidamente tenho chamado atenção para o fato de que devemos acompanhar com todo cuidado o que está acontecendo naquele país, que inegavelmente é uma das grandes potências do mundo contemporâneo, com características que lhes são peculiares: no lançamento das Olimpíadas o período recente da história daquele país foi apagado simplesmente, como se a revolução cultural não tivesse ocorrido e tampouco Mao fosse a grande figura histórica até recentemente idolatrado.

Impossível de se esquecer a supressão de personagens nas fotografias oficiais da antiga União Soviética quando caiam em desgraça. Países com regimes autoritários possuem práticas que merecem nosso repudio, se queremos universalizar efetivamente certos princípios de respeito aos direitos humanos. No caso chinês, o poder econômico representado pelo seu mercado traz uma enorme sedução no sentido de se aumentar a tolerância ao desrespeito aos direitos humanos praticados naquele país, a exemplo das execuções sumárias com imposição de humilhações às famílias dos executados – como a cobrança das balas utilizadas nas execuções – além de questões como a autonomia do Tibete, conhecida e amplamente divulgada pela mídia.

A China é um país que devemos acompanhar com respeito e esforço no sentido de fazer com que seus dirigentes e sua sociedade compreendam que suas decisões terão enorme repercussão no futuro da humanidade e do planeta. Hoje está no primeiro ou segundo lugar nas emissões de gases de efeito estufa, ainda que a sua participação per capita seja comparativamente muitas vezes menor que a dos norte americanos e europeus. Em outras palavras, é indispensável ter aquele grande país na liderança da sustentabilidade, o que exigirá um esforço gigantesco da sociedade civil e da mídia, com a finalidade de engajar os chineses no desafio de combate ao aquecimento global, de um patamar civilizatório diferente do atualmente praticado pelos países ocidentais em termos de consumo e produção.

Na reunião de Bali em dezembro último, os chineses surpreenderam positivamente ao sinalizar que estariam dispostos a se engajar mais efetivamente na redução do lançamento de gases de efeito estufa, propondo quantificar e permitir a verificação de suas emissões. Certamente, o engajamento da China e Índia é uma condição sine qua non para o regime internacional que se pretende estabelecer pós 2012, quando se esgota a primeira fase do Protocolo de Kyoto.

No Brasil continuamos em marcha lenta no que tange ao assunto de mudança do clima, sendo importante registrar que o governo Lula, e o presidente pessoalmente, não perceberam que estamos perdendo o bonde da história: o Brasil é o quarto emissor de gases efeito estufa em função dos desmatamentos da Amazônia. Quando pensamos que vamos avançar na matéria na direção correta, assistimos a medidas que nos coloca na contramão da história, como a conversão da Medida Provisória em Lei que legitima a grilagem de terra na região (Lei n. 11.763/2008), além do veto que desobrigou o estabelecimento de compatibilização com o Zoneamento Ecológico Econômico.

Na semana passada, declarações do Ministro Mangabeira Unger demonstraram que nem sempre intelectuais renomados se transformam em líderes políticos respeitados. No encontro em Cuiabá, o Ministro criticou a legislação ambiental brasileira por entendê-la muito restritiva, no que tange a exigências relativas à observância da reserva legal, esquecendo manifestações anteriores feitas por ele que remetem o problema da Amazônia fundamentalmente à regularização fundiária. Seria interessante recomendar ao jurista Mangabeira Unger a leitura da própria Constituição Federal, especificamente do Artigo 225, com ênfase nos parágrafos 4º e 5º, que consideram o bioma Amazônico patrimônio nacional e que determinam que as terras devolutas são indisponíveis quando necessárias a proteção dos ecossistemas naturais.

Certamente é sabido que o desmatamento da Amazônia tem conseqüências trágicas para o sistema climático do planeta, podendo afetar negativamente o agribusiness praticado na região amazônica, como a Embrapa divulgou em seu estudo nos últimos dias. O estudo intitulado “Aquecimento Global e Cenários Futuros da Agricultura Brasileira” mostra que a economia e a geografia da produção agrícola podem ser prejudicadas devido às graves conseqüências das mudanças climáticas. Portanto, o que deveria ser uma preocupação estratégica do Ministério Extraordinário de Assuntos Estratégicos se transformou em declarações infelizes com pouca contribuição efetiva para o enfrentamento da questão.

É inevitável o sentimento de que há pouca luz no fim do túnel quando se vê que estamos longe de compreensão por parte do governo federal de que o Brasil poderia com facilidade liderar o esforço de implementar um modelo de sustentabilidade, tornando-se uma referência ética indispensável no respeito aos direitos das futuras gerações. O presidente Lula por sua vez poderia se tornar um Nelson Mandela caso empunhasse a bandeira do combate à pobreza e ao aquecimento global.

Nas Olimpíadas, pelo estabelecimento de novos padrões civilizatórios, ainda estamos na lanterna.