Cuidar do lixo: o Brasil no século XXI

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- outubro 31, 2013

Na semana passada, participei da 4ª Conferência Nacional de Meio Ambiente dedicada aos resíduos sólidos. Nas palavras da Ministra Izabella Teixeira na abertura do evento, o tema dos resíduos é a prova cabal de que a agenda urbana ganhou massa crítica e que, daqui para diante, deverá estar presente em complementação à agenda tipicamente verde.

Participei de uma mesa com mais de trezentas pessoas, na qual pude relatar os longos dezoitos anos da aprovação da legislação que define a Política Nacional de Resíduos Sólidos, uma vez que o primeiro projeto de lei foi de minha autoria em 1992.

A idéia de uma Política Nacional sempre teve o propósito de tirar o tema do lixo do limbo no qual ele sempre foi tratado: a União, governo federal, sempre acreditou que esse tema não era suficientemente relevante para ser colocado na sua esfera. Por outro lado, os estados sempre defenderam que a matéria era de esfera exclusivamente municipal, e os municípios, por sua vez, sempre apontaram dificuldades financeiras para enfrentar as soluções.

E mais do que isso, o projeto enfrentou grande resistência por parte do setor empresarial, que não queria assumir nenhuma responsabilidade em relação ao pós-consumo. Ou seja, a partir da colocação do produto na prateleira cessariam as suas obrigações em relação ao destino final do bem ou mesmo a sua recolocação no sistema produtivo.

Desse modo, usando da sua influência no Congresso, conseguiram paralisar o avanço da tramitação do projeto original, que ficou apensado a um projeto do Senado Federal, cuja abrangência estava restrita a resíduos de saúde.

Em 2010, com apoio do governo federal e a liderança do Deputado Federal Arnaldo Jardim, chegou-se a um acordo que resultou nesta nova legislação, que representa um grande avanço na matéria, mas que, antes de qualquer coisa, gerou um processo de médio prazo para equacionar a questão do lixo.

Fixou-se um calendário, difícil de ser alcançado, para se por fim aos lixões e introduziu-se o conceito de logística reversa em conjugação com o de responsabilidade compartilhada, que tem como objetivo criar as bases para “uma economia circular”, isto é, a idéia de que os bens e serviços sejam desenhados para serem re-introduzidos na economia após seu consumo. Evita-se, assim, o desperdício de recursos materiais e energia e, mais do que isso, incorpora-se a dimensão social com o reconhecimento dos catadores e sua importância neste processo.

Torna-se importante se assinalar que o lixo não é um problema só do Brasil, estando cada dia mais presente na pauta das discussões internacionais por várias razões que vão desde o seu impacto na biodiversidade, em função da ingestão de plásticos por vários animais, especialmente as tartarugas, passando pelas ilhas continentais de resíduos que navegam tristemente pelos oceanos. Aliás, a revista Science (“Working with Waste”, agosto de 2012, vol. 337) recentemente dedicou sua capa ao tema.

Mas o que mais me impressionou nesta Conferência foi a constatação de que a sociedade, enfim, se apropriou desse tema tão importante: três mil pessoas do Brasil inteiro estiveram em Brasília debatendo o assunto nas suas múltiplas dimensões. Quem imaginaria tal repercussão há vinte anos atrás?

Nas palavras de Silvano da Costa, presidente da Amlurb – Autoridade Municipal de Limpeza Urbana de São Paulo, “não há caminho de volta, teremos que imprimir velocidade no processo marcado pela nova legislação, tornando o Brasil uma referência neste tema”.

Artigo publicado no jornal Brasil Econômico em 31 de outubro de 2013.