Engajamento empresarial: a hora é agora!

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- agosto 29, 2013

Semana passada o Príncipe Charles esteve no Brasil. O assunto: meio ambiente e mudança do clima.

 

Tive a oportunidade de participar da organização de uma reunião entre o Príncipe e executivos das principais empresas brasileiras, sob a liderança do Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV – GVces e da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável – FBDS, com apoio da Embaixada Britânica.

 

Como afirmou Rachel Biderman da FGV, o setor empresarial tem enorme responsabilidade na oferta de soluções para o problema do aquecimento global, ao comentar os cem meses mencionados pelo Príncipe para que a humanidade possa tomar as medidas necessárias ao enfrentamento da questão. Israel Klabin da FBDS, por sua vez, considerou o prazo muito longo, dado os últimos estudos demonstrando que a elevação do nível do mar será maior do que se previu, bem como o número de refugiados ambientais decorrentes dos incidentes climáticos graves. Tais dados foram claramente expostos na reunião sobre Mudanças Climáticas ocorrida em Copenhague em 10 a 12 de março, em que pesquisadores apontaram que o nível do mar deve subir em um metro ou mais até 2100, isto é, o dobro dos 50 cm previstos pelo IPCC em 2007. Ainda, esta elevação significará a provável necessidade de migração de cerca de 600 milhões de pessoas- 10 % da população mundial, pois terão suas áreas inundadas.

Interessante na reunião foi verificar que o setor empresarial brasileiro pretende exercer um papel mais ativo em relação ao aquecimento global em várias frentes. A primeira delas no campo diplomático, requerendo que o Brasil assuma um papel diferenciado nas negociações em curso, notadamente em relação aos eventuais compromissos dos ditos países em desenvolvimento. Em outras palavras, estamos no mesmo barco e não é mais possível persistir no jogo de soma zero, como de certo modo os EUA protagonizou na era Bush, com a simpatia velada da China, hoje o principal emissor de gases efeito estufa. Se os EUA não reduzem suas emissões também não o faremos. Com isso todos perdem inclusive as futuras gerações.

 

O campo diplomático não exclui o engajamento do setor empresarial de uma postura mais ativa em termos de redução de emissão em seus produtos e serviços. Muito pelo contrário, a antecipação a marcos regulatórios assegura, a médio prazo, vantagens competitivas, notadamente no que tange à intensidade de carbono nos processos de produção e consumo. Traduzindo em miúdos, uma economia de baixa intensidade em carbono é o passaporte de acesso a mercados dos países desenvolvidos.

 

A reunião de cientistas em Copenhague confirmou que o mundo está passando por transformações rápidas e importantes. Temas que até recentemente constavam unicamente da agenda da comunidade científica e ambientalista hoje são elementos estratégicos para o setor empresarial. A solução e a formulação de políticas públicas exigem a capacidade de novas alianças estratégicas, a exemplo de uma parceria entre o setor empresarial cosmopolita e a sociedade civil organizada, com o claro objetivo de se combater entre outras coisas o desmatamento da Amazônia. Este prejudica a imagem do país e as nossas exportações, de modo que nenhuma empresa importante vê com bons olhos o que está ocorrendo com a maior floresta tropical do planeta, sem levar em consideração os impactos que essa destruição pode trazer no regime de chuvas do sudeste brasileiro…

 

O ex Ministro Luiz Fernando Furlan, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, atual presidente da Fundação Amazonas Sustentável, confirmou a idéia de que o desenvolvimento sustentável gera oportunidades importantes para o país. Aliás, comentou que um dos requisitos para a exportação de carnes para o exterior passa pelo atendimento de normas de bem estar animal. Quem poderia imaginar há poucos anos atrás que o consumidor colocaria como critério de escolha melhores condições dadas aos animais, quer no seu abate, quer no seu transporte. Aliás, há alguns anos atrás apresentei um projeto de lei nessa direção e o mesmo foi motivo de chacota na Câmara dos Deputados. Certamente, ele foi rejeitado na Comissão da Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural, bem como um outro projeto que proibia a Farra do Boi em Santa Catarina.

 

“Coisa de ecologista” ou coisa a ser levada a sério?

 

Nesta semana a revista Veja publicou uma matéria ridicularizando os ambientalistas, sob pretexto de que estariam combatendo papel higiênico macio, quando em verdade a discussão se concentra no uso de matéria prima proveniente de florestas primárias existentes na América do Norte. Pouca gente sabe que existe no Canadá e EUA enorme pressão sobre florestas temperadas existentes naqueles países, sendo que as mesmas merecem o mesmo grau de preocupação que existe no mundo em relação às florestas tropicais. Sustentabilidade hoje é compreendida na cadeia produtiva como um todo, de modo a assegurar a rastreabilidade das matérias primas e com isso garantir a integridade sócio-ambiental em todo o processo produtivo.

 

A questão não se refere à maciez do papel higiênico. E sim ao fato de que florestas de enorme importância ecológica estão sendo destruídas simplesmente porque certas empresas deixam de investir em tecnologia sustentável, impondo um ônus a toda sociedade e às futuras gerações. O Brasil nesse campo pode dar exemplo, pelo fato de que pelo espírito visionário de um empresário já falecido, Max Feffer, inovamos na produção de papel e celulose, tornando-nos um exemplo em termos de competitividade e inovação tecnológica.

 

A tendência irreversível das próximas décadas é a preocupação com o meio ambiente em todo o ciclo de vida dos produtos. Produzir com menor intensidade de recursos ambientais, entre os quais energia, e assegurar que os bens sejam reciclados após o consumo.

 

Os líderes empresariais presentes no encontro com o Príncipe Charles têm clareza quanto ao seu papel no combate ao aquecimento global. E ainda que se leve em consideração a complexidade das negociações em curso sobre os compromissos dos países a serem firmados em Copenhague no final do ano (COP 15), deixaram claro que pretendem se engajar efetivamente na oferta de soluções para os problemas climáticos do planeta. Não apenas pelo fato de que a sobrevivência de seus negócios depende desse engajamento, mas fundamentalmente porque compreendem a urgência de atuarem na construção de uma cidadania planetária.

 

A cidadania planetária requer que tenhamos acesso a bens e serviços mais sustentáveis. Governos preocupados com médio e longo prazo. Comunidade científica engajada em diagnósticos e soluções efetivas. Mídia preparada para compreensão e divulgação adequada dos problemas. Sociedade civil aberta a alianças estratégicas. E principalmente, indivíduos eticamente comprometidos com o bem coletivo.

Artigo publicado no Terra Magazine