O incômodo Greenpeace

Artigos

- outubro 14, 2013

As ONGs no Brasil têm sido objeto de grande controvérsia basicamente pelas relações promíscuas com o poder público e, mais do que isso, têm sido usadas para rapinagem do dinheiro público.

E aí vai a pergunta: de que ONGs estamos falando?

O importante, em relação a elas, é que estão trazendo transformações muito positivas de organização da sociedade, sendo que cada vez mais o seu papel é reconhecido, o que por sua vez traz maior responsabilidade em termos de transparência e prestação de contas (accountability).

Este fenômeno é relativamente recente e creio que a Rio 92 teve um papel importante no reconhecimento da sociedade civil organizada, de modo que, de lá para cá, nas grandes discussões internacionais, as ONGs têm uma legitimidade indiscutível.

Basta ver qualquer coletiva destas últimas para se atestar como a sua opinião influencia a mídia internacional.

A China, por exemplo, se vê obrigada a responder relatórios da Anistia Internacional.

Não vou tratar aqui das ONGs governamentais, até mesmo porque, em muitas situações relatadas pela imprensa, estamos diante de caso de polícia.

Isto é, exigindo medidas adequadas que vão desde a punição dos envolvidos até a desconsideração da pessoa jurídica, com objetivo de ressarcimento ao erário.

Uma das ONGs mais emblemáticas no mundo globalizado é o Greenpeace, que se tornou um quarentão no ano passado e que sintetiza bem esta nova arquitetura política do século 21.

Criado em 1971 por um grupo de ambientalistas e alternativos que protestavam contra a guerra, veio a se transformar em uma entidade com presença em 40 países, agregando em torno de si mais de 3 milhões de filiados no mundo todo.

E o que é importante: o Greenpeace não recebe dinheiro de governos e empresas, o que lhe garante independência e autonomia diante desses poderosos.

Esse número de filiados deve surpreender os partidos políticos do mundo inteiro que hoje enfrentam muitas dificuldades em atrair para seus quadros pessoas dispostas a trabalhar voluntariamente, de modo que é importante assinalar a atração que o Greenpeace exerce especialmente sobre os jovens.

Estes se identificam com as ações diretas realizadas pela entidade que, pelo seu caráter espetacular, têm repercussão no mundo afora.

Mas se enganam aqueles que pensam que a sua ação se reduz a tais gestos. Hoje, sua capacidade de influenciar as negociações internacionais de clima, a pesca das baleias, os oceanos, a biodiversidade, o nuclear é enorme.

Os grandes temas abrangidos pelo seu mandato estão amparados no que há de melhor da ciência, produzindo e coletando informações que são absolutamente indispensáveis na formulação de políticas públicas internacionais e nacionais.

O Greenpeace Brasil teve um papel absolutamente relevante na decisão das grandes redes varejistas e frigoríficos de rastrear a carne proveniente de áreas desmatadas da Amazônia.

Este exemplo é paradigmático porque indica a relevância de monitoramento da cadeia produtiva e indica a possibilidade real de uma parceria estratégica entre o setor empresarial e a sociedade civil.

O sucesso do Greenpeace talvez explique por que tantos se incomodam com ele: ele está cumprindo o que seus fundadores se comprometeram em 1971.

Artigo publicado no jornal Brasil Econômico em 13 de fevereiro de 2012.