Petrobras: a novela continua

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- setembro 12, 2013

Recentemente a opinião pública brasileira se viu diante de uma controvérsia envolvendo a Petrobras, no que tange ao cumprimento da legislação ambiental brasileira, mais especificamente a Resolução CONAMA no. 315/2002. Esta Resolução estabeleceu que um óleo diesel de melhor qualidade, com teores de enxofre de 50 ppm, deveria ser ofertado a partir de 1º de janeiro de 2009. Passados mais de dois anos do início das suspeitas em relação ao eventual descumprimento por parte da Petrobras, ainda não há uma definição clara de quando a população brasileira começará a respirar um ar mais limpo.

Sei que já abordei esse mesmo assunto inúmeras vezes, mas nunca é demais relembrar que a poluição atmosférica na cidade de São Paulo é responsável anualmente por cerca de três mil óbitos de acordo com a Faculdade de Medicina da USP. As primeiras estimativas do efeito da poluição do ar, já na década de 90, mostravam que a mortalidade total de idosos está diretamente associada com a variação do material particulado inalável.

Muito mais do que uma discussão em relação ao cumprimento ou não da legislação ambiental brasileira, o Caso Diesel envolvendo a Petrobras e as montadoras do país reforça o meu argumento do artigo da semana passada, no qual defendi que o problema dos relatórios de sustentabilidade reside no fato de que não há entendimento do significado da sustentabilidade por parte do setor empresarial de maneira geral, nem dos esforços necessários para se chegar a ela.

Creio que a atitude da Petrobras diante da poluição atmosférica no Brasil é moral e eticamente questionável, na medida em que coloca a vida de seus consumidores e de toda a população em risco e não condiz com a imagem sustentável que costuma defender diante de seu público. Há que se estabelecer coerência entre a imagem construída e sua real atuação no mercado, ou seja, investimentos em imagem e publicidade deveriam estar necessariamente ligados ao “core business” da empresa, neste caso a produção de combustível cada vez menos poluente.

De acordo com o escritor canadense Bob Willard, existem cinco estágios a serem percorridos pelas empresas na jornada rumo à sustentabilidade. O primeiro estágio é do não cumprimento legal, passando depois ao cumprimento de fato, muitas vezes feito apenas em função de crescentes pressões externas, para então começar a integrar uma estratégia de sustentabilidade no cerne de sua atuação. Para se ter uma idéia, o quinto estágio se refere à empresas que já nascem dentro deste novo paradigma, tendo como missão a sustentabilidade, e suas atividades apenas os meios pelos quais ela é promovida. Portanto, o desafio da sustentabilidade vai muito além do mero cumprimento legal, devendo este ser considerado o mínimo obrigatório para qualquer empresa que pretenda iniciar essa jornada.

No caso da Petrobras, há um agravante pelo fato de se tratar de uma empresa estatal sob o comando da União, sendo um símbolo importante na história do Brasil. Além disso, o desempenho econômico-financeiro da Petrobras nos últimos anos é absolutamente incontestável, de modo que pessoalmente devo confessar que não consigo encontrar a motivação para tanta resistência. Não estamos falando de uma empresa com dificuldades financeiras, sem acesso a tecnologia…

Este caso é emblemático porque lembra Cubatão na década de 80, quando o Brasil defendia poluição como sinônimo de progresso. Naquela época o país era outro. Vivíamos sob regime autoritário e as atividades petroquímicas eram consideradas de interesse nacional, o que se constituía num salvo conduto para poluir. Do mesmo jeito que utilizávamos o Direito à Vida como base legal para questionar a poluição de Cubatão, estamos trilhando o mesmo caminho de 30 anos atrás: o cidadão não tem escolha em relação ao ar que respira, ao contrário do fumante cuja escolha é decisiva quanto à sua saúde. Enfim, só temos a lamentar porque qualquer derrota judicial ou mesmo perda de reputação da Petrobras só tem um grande prejudicado: o cidadão brasileiro.

Nos últimos dias recebemos uma comunicação do Global Reporting Initiative (GRI) confirmando a nossa posição de que a Petrobras insiste em publicidade enganosa, ao afirmar ser a empresa mais transparente do planeta. Quisera isso fosse verdade.